Buena Onda

“Compartilhar a dor não é sofrer no coletivo, e sim livrar quem dela sofre”. Essa frase cheia de sentimentos e coragem foi lida em um livro por mim na última semana. Um livro que conta a história de um jovem, que largou tudo, a vida, os estudos, os sonhos, para se dedicar 100% a sua avó que havia recebido o diagnóstico de Alzheimer.

O livro conta entre tanto afeto, amor e leveza como foram os anos dividindo o teto e a vida com essa senhora, por quem o autor tem tanto amor.

Eu me identifiquei de cara, pois logo após ter tirado a minha carteira de motorista Inglesa, peguei o primeiro avião da Inglaterra para o Brasil quando ouvi do médico da minha mãe que era melhor que eu voltasse. Terceiro voo para o Brasil em menos de um semestre, eu sei que tá puxado acompanhar.

Pedi demissão do meu trabalho dos sonhos, chorei e dei um beijo demorado no meu marido e cheguei aqui no começo de Junho com uma passagem só de ida, com a missão de junto da minha família cuidar integralmente da nossa fortaleza.

Sei que o Buena Onda é um blog de viagens e que divido as minhas experiências nesse mundão. Mas a vida está batendo forte e desde o começo do ano, ela não me poupou de preocupações a distância, ligações desesperadoras do outro lado do oceano e muita apreensão do que estava por vir, ou já chegou. Dizendo isso, e inspirada pelo livro, decidi botar um pouco pra fora sabe? Externalizar, dividir e ser acolhida. Vem comigo?

Começamos pelo começo

Por favor não fique triste. Sei que nos últimos meses eu tenho aberto a minha boca e entristecido pessoas queridas, e que meus assuntos também não andam dos mais agradáveis para uma mesa de bar, mas novamente, sou eu vivendo o agora intensamente a cada dia.

O motivo de estar no Brasil veio como um tsunami, em tudo que eu venho construindo nessa vida nova, e é sobre quem eu sou, o ventre de onde nasci e todas as memórias incríveis que criei em 36 anos de vida.

Minha mãe está doente! Com um melanoma metastático, que vem se arrastando nos últimos cinco anos. O último diagnóstico da volta da doença chegou na véspera do Natal de 2022, um mês antes do meu visto de esposa sair e eu me mudar pra Inglaterra.

É um câncer agressivo que surgiu no pâncreas e hoje acomete outros órgãos, inclusive a cabeça. Nessa jornada passamos por cinco tratamentos diferentes (entre imunoterapia, radio, quimio), cirurgias e procedimentos de emergência e não tivemos sucesso no controle dessa doença devastadora.

Ela está assistida por uma equipe excelente no Hospital AC Camargo, do qual só tenho que agradecer por tanto. A realidade é que recentemente ela iniciou um tratamento paliativo para que tenha conforto nessa jornada. Hoje escrevo do quarto de hospital onde esta internada, zelando para que seja tratada como uma Rainha nas limitações que a jornada dela oferecem no momento.

Seguindo colocando pra fora

Câncer é uma merda! Ele destrói tudo. Ele adoece quem está ao redor. Ele alcança e machuca todo dia um pedaço seu que você nem imagina ser possível! Ele te marca pra sempre e em sua grande parte, leva as pessoas que você ama. Eu tenho uma lista delas que fizeram sua passagem na conta dele e sinto falta todos os dias da minha existência.

Por esse motivo voltei para o Brasil! Voltei para correr contra o tempo, para grudar na minha mãe e na minha família e aproveitar cada segundo de vida ao lado deles. Para dormir e acordar agradecendo por mais um dia.

Como umbandista, mesma religião que divido com minha mãe, nós acreditamos que estamos nesta vida por um propósito e que quando ele termina, fazemos nossa passagem no caminho da luz. Isso com certeza conforta meu coração. Ir ao centro, acender minha vela e chorar aliviam minha dor.

O cansaço mental é extremo, as adaptações são infinitas, mas eu sigo aqui, equilibrando todos os pratinhos, enxugando as feridas, sorrindo e também tentando fazer o que eu gosto. Porque eu já aprendi que a vida é JÁ, e que mesmo nessa fase tão sem controle de nada, tenho que continuar vivendo e sonhando.

Engraçado como as coisas pequenas se tornam comemorações, cada momento de troca é um presente e que bonito é observar a força de uma família, que quando a gente se junta, é imbatível. E como não destacar as pessoas ao meu redor.

Eu sou muito grata por aqueles que estão me pegando pela mão, pelo braço e pelo colo. Que sabem de tudo, ou de quase nada. Que surgem dos lugares menos prováveis, que sentem sua dor em uma conversa no whatsapp e choram com você. Que surgem com remédios, docinhos, palavras de conforto. Que ficam em silêncio, não sabem o que dizer mas estão sempre ali. Por todas as orações e palavras, pelos abraços e por tudo que ainda há por vir.

Porque no fim das contas Ele sabe de tudo, tá tudo escrito e preparado, fora do meu entendimento de virginiana controladora louca. A única certeza que tenho é que minha mãe é uma guerreira e eu vejo diariamente a sua luta e desejo de melhorar. E também a certeza que estou onde tinha que estar todos os dias quando acordo e que no futuro, é isso que vou levar no meu coração!

O meu profundo Obrigada, em meu nome e no da minha família ♡

Seguimos!